Margareth Maciel de Almeida Santos
Doutora em Sociologia Política
Membro do Instituto Nacional dos Advogados do Brasil (IAB)
Confesso que fiquei muito triste com a saída de Nelson Teich, ex-ministro da Saúde, que foi anunciada no dia 15 do corrente mês. Ele, homem sério, de poucas palavras, que visitou de perto a situação de Manaus, Rio de Janeiro e outros lugares, pediu demissão em meio à pandemia do Coronavírus.
O que será que ocorreu?
Sabemos que a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou estado de pandemia em razão do coronavírus, como também é notório por meio da mídia, o descomo existente entre Bolsonaro e a OMS, pois o presidente é contra o isolamento social. Nesse contexto, Teich, em primeiro lugar médico, oncologista, tornou-se alvo de ataques de apoiadores do presidente, que despreza e desencoraja as medidas de distanciamento físico e o confinamento que foi introduzido pelos governadores de estado e prefeitos. Sobre os efeitos da cloroquina, deixou claro o seu ceticismo sobre os efeitos da droga para o combate do coronavírus, enquanto Bolsonaro afirmou que exige que a cloroquina seja istrada para pacientes da Covid-19 desde os primeiros sintomas. Teich também foi cobrado por apoiadores de Bolsonaro para recomendar o uso amplo da cloroquina. Faltou diálogo entre o presidente e o ex-ministro, e ele como médico preferiu ficar do lado da Organização Mundial da Saúde. O que importa é que registrou sua coragem em tentar a busca para estancar a multiplicação do coronavírus.
Em falar em prefeito, em Araraquara uma mulher foi detida pela Guarda Civil Municipal após descumprir o decreto da prefeitura de isolamento social contra o coronavírus. É difícil entender o fato, da prisão da mulher por causa do coronavírus, pois um dos direitos fundamentais tutelados é a liberdade de ir e vir. De que forma poderemos relativizar um direito fundamental?
A Lei nº13.979/20 dispõe “sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do coronavírus”. O artigo 3º da referida lei, “autoriza, no enfrentamento da emergência de saúde pública, a adoção, o isolamento, quarentena e restrição excepcional e temporária de entrada e saída do País.” Assim, todos nós deveremos estar sujeitos ao cumprimento das medidas previstas, para garantir a saúde coletiva.
Durante o vídeo apresentado no dia 22 de maio, da reunião ministerial do governo Bolsonaro este, repudiou a atitude do prefeito. Nesse contexto, Braga Neto, disse também na referida reunião que “se a economia não voltar, nós vamos ter gente morrendo de fome”. E a ministra Damares Alves fez críticas à ação de governadores e prefeitos favoráveis, ao isolamento social e disse que a pandemia vai ar, mas governadores e prefeitos responderão processos e nós vamos pedir inclusive a prisão de governadores e prefeitos.”
Na apresentação do vídeo, o presidente demonstrou sua personalidade forte, mas em pânico, sentindo-se perseguido, ainda ficou evidente o período de instabilidade a que o nosso Brasil está atrelado, vimos a situação política caótica e o cenário econômico se estagnando. Acusou governadores em vez de enfrentar a praga com união e preparo.
Mesmo que realmente queiramos, eu entendo que poucos são capazes de compreender os grandes problemas reais do mundo. Por exemplo, como compreender diante de uma pandemia que ainda existem fraudes, corrupção, a complexidade dos conflitos entre aqueles que veem a cloroquina como um remédio eficaz e o outro que mostra os seus efeitos colaterais, esquecendo dos efeitos de uma dipirona? Eu não sei dizer se qualquer medicação ou vacina apresentam riscos para a saúde do paciente? Entender a economia global é muito complicado! Não sei se existem laboratórios controlando a mídia para se enriquecerem e fomentando fantasias para o terror da pandemia. Não sou médica, e não entendo nada sobre o coronavírus, a não ser por meio das informações que ouço todos os dias. O que eu compreendo é que a saúde e a vida do povo deve ser o foco das políticas públicas e o Estado tem que ser eficiente.
Ainda sobre a reunião ministerial, não sei dizer se os palavrões proferidos pelo presidente, e sua forma terrível de se manifestar, vai gerar um desgaste ou não sobre sua pessoa nas próximas semanas. Também é difícil saber se o establishment político-empresarial, irão começar a duvidar da capacidade do presidente, pois preservar o programa de Paulo Guedes e a agenda conservadora do presidente é um desafio. Pode-se dizer que existe um paradigma onde “a crise sanitária gera a crise política e consequentemente a crise econômica”. Ficou evidente que para o presidente, a pobreza, a violência e desemprego é a sua maior preocupação. A linha de governo de Bolsonaro se apresenta como economicamente liberal, moralmente reguladora, punitiva e fundamentalista no sentido religioso. Entendo que esse “conservadorismo” é a principal causa de Bolsonaro não se alinhar com as diferentes forças políticas para seguir rumo positivo na defesa do Brasil. Me parece que em uma reunião ministerial, apagar incêndios são desafios de todos os ministros, diante de tanta instabilidade e mudanças que deverão ser estudadas.
Por outro lado, posso dizer que o governo de Lula, começou a declinar nos anos 2010 pela corrupção, se aprofundou gerando uma crise no Brasil que se perpetua até hoje e com a pandemia ampliaram-se as suas dimensões. Lembremos dos motivos da prisão do ex-presidente Lula, que tem um valor consolidado na história brasileira, quando gozou de prestígios na opinião pública, seu discurso sobre ética na política, tornou-se o escândalo do mensalão, a corrupção na Petrobrás (o ‘Petrolão’). E no entanto é irônico, que mesmo com tudo isso, eu não me lembro de nenhuma reunião do presidente Lula, com seus ministros ter sido televisionada ou circulando em qualquer tipo de mídia.
O que ocorreu foi que o ex-ministro e ex-juiz Sérgio Moro ao deixar o governo, acusou o presidente Bolsonaro de tentar interferir na Polícia Federal. Ele disse que Bolsonaro pediu a ele, no começo de março deste ano, a troca do chefe da PF no Rio de Janeiro, mas deixou claro que não acusou Bolsonaro de ter cometido algum crime. O ministro Celso de Mello autorizou a divulgação da íntegra do vídeo. Esse revelou ao país o procedimento de ministros dentro do Palácio do Planalto.
Será que Bolsonaro cometeu algum crime quando decidiu trocar o comando da Polícia Federal, dois dias depois de ameaçar interferir no órgão durante essa reunião? A postura do presidente, a defesa de prisão de ministros do Supremo Tribunal Federal por parte de sua equipe.
Para o cientista político Carlos Melo, professor do Insper avalia o vídeo da seguinte forma, “o vídeo não foi uma bala de prata, algo que provocasse uma perda terrível de capital político do Presidente da República. Acho que ele já perdeu bastante capital político antes disso e está cercado hoje por sua base mais fiel, que é sensível aos temas que foram tratados na reunião”.
Quem gosta do jeito de Bolsonaro irá apoia-lo ainda mais, e quem não gosta continuará a defender um processo de impeachment. Todos nós conhecíamos o “jeito de Bolsonaro” quando se candidatou as eleições de 2018, e após tantas especulações, o evento “#ele não” veio o resultado final: a entrada de militares no centro do poder político via voto popular. Bolsonaro foi eleito por meio do processo democrático e não por intervenção de militares.
Retornando a pergunta sobre Teich, ter escolhido a OMS, em vez de ficar como ministro da saúde, penso que após ter participado da reunião, deve ter ficado assustado com a forma de como os ministros se posicionam durante uma reunião ministerial no Palácio do Governo, em Brasília.
PAZ E BEM!